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As cadeiras são um inimigo da boa postura?

O ser humano é muito adaptável. As nossas características resultam da adaptação ao meio em que vivemos. Pessoas que vivem em climas mais frios, com poucas horas de sol, têm..

O ser humano é muito adaptável. As nossas características resultam da adaptação ao meio em que vivemos. Pessoas que vivem em climas mais frios, com poucas horas de sol, têm pele tendencialmente branca, e pessoas que vivem em climas quentes, com maior exposição ao sol, têm pele mais escura, para diminuir a absorção de raios ultravioleta. Claro que, após a globalização, tudo mudou. Podemos dizer que criámos ferramentas à nossa medida.

Por outro lado, adaptámo-nos a outras ferramentas que desenvolvemos, como as cadeiras, que apesar de existirem há mais de 5000 anos, só se tornaram comuns no séc. XVI, e extremamente populares nos séc. XVIII e XIX.

Antes do séc. XVIII, era fácil ter uma cadeira, mas a maioria da população não gostava muito delas. Não é fácil sentar-se numa cadeira de madeira maciça durante muito tempo, e as cadeiras estofadas eram extremamente caras. Quando a cadeira se tornou popular no séc. XIX, ocorreu ao mesmo tempo uma mudança nos nossos trabalhos. Antes, o trabalho era mais manual e de fábrica. Após a Revolução tecnológica, que nos trouxe máquinas de escrever, telégrafos e a electricidade, o mercado de trabalho mudou.

A nova categoria de auxiliares de escritório foi a profissão com maior e mais rápido crescimento na segunda metade do séc. XIX. Em 1851, os censos sugerem 44 mil pessoas com esta profissão. Duas décadas depois, já eram 91 mil, mais do dobro!

Atualmente, os trabalhadores sedentários são a maioria. Jogos, streaming e telemóveis são atividades que exigem que fiquemos parados. Os humanos precisam de cadeiras, sofás e divãs para todas estas “actividades”. Não deixam de ser actividades para a mente, mas raramente o são para o corpo.

Um estudo feito pela British Heart Foundation (Fundação Britânica do Coração) sugere que temos cerca de 9,5 horas por dia de tempo sedentário. Isto significa que os humanos modernos são inativos durante 75% do seu tempo. Isto acarreta alguns problemas. Os nossos corpos fazem o possível para se adaptarem.

A Lei de Wolff e a Lei de Davis são a origem da popular “Lei do Uso e do Desuso”, para os ossos e para os tecidos moles do corpo, respectivamente. Em ambos os casos, dizem que o músculo ou o osso responderão ao aumento da carga ou à inactividade. Os ossos ficam mais finos ou mais densos. Músculos, mais fortes ou mais fracos. Sentados durante tanto tempo, a maior parte da musculatura da nossa coluna fica relaxada. Não é de se admirar que, actualmente, a dor nas costas seja a causa principal de incapacidade em todo o mundo.

Os humanos da era Paleolítica morriam com mais frequência na infância. Violência e lesões também foram causas comuns de mortalidade na vida adulta. Os humanos modernos, porém, morrem principalmente devido a distúrbios metabólicos (como diabetes tipo 2) e doenças cardíacas – sendo a inatividade física um grande factor de risco.

Um estudo de 2012 quis investigar os efeitos da inactividade física. Reuniu dados comportamentais de 7.813 mulheres e descobriu que, aquelas que ficavam sentadas em média dez horas por dia, tinham telómeros mais curtos (um indicador de envelhecimento celular). Os seus hábitos sedentários provocaram um envelhecimento biológico de oito anos!

Tal como a raposa selvagem que, quando é domesticada, as orelhas deixam de ser pontiagudas e a cauda passa a estar enrolada, as alterações no nosso estilo de vida podem provocar mudanças secundárias no nosso corpo, inclusive a fisionomia da nossa coluna.

Bibliografia

Cregan-Reid, Vybarr. “Anthropocene: why the chair should be the symbol for our sedentary age”. The Conversation. 9 November 2018

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